Por Marcos Rolim
A série de matérias publicadas por Zero Hora esta semana sobre a corrupção nos presídios gaúchos assinala marco decisivo para o debate sobre o sistema penitenciário e nos mostra o potencial virtuoso do jornalismo – em tudo diverso das opções pela superfície, pelo preconceito e pela manipulação.
* Após motins e agressões, BM assume direção de prisão em Caxias do Sul
* Presos agredidos na Penitenciária Regional de Caxias são transferidos para Porto Alegre
* Susepe abandona a Penitenciária Regional de Caxias
* BM permanecerá por 30 dias no comando da Penitenciária Regional de Caxias
* Colapso devolve à Brigada papel-chave nas penitenciárias
* Presos fazem greve por atraso de salários em Erechim
* Corrupção nas cadeias: Estado tem dificuldade de punir maus agentes
* Corrupção nas cadeias: "não vejo constrangimento", diz corregedor acusado de omissão
* Corrupção nas cadeias: rotina de espancamentos faz preso cumprir pena em batalhão da BM
* Agente penitenciária que denunciou corrupção nas cadeias é punida pela Susepe
O que as agudas reportagens de Carlos Etchichury e Juliana Bublitz trouxeram à luz é aquilo que todos os que conhecem o sistema sabem desde sempre: nossos presídios são o equivalente do inferno e muitos dos que lá trabalham se movem com desenvoltura na lógica infernal que une omissão, violência e corrupção. É claro que o fenômeno não diz respeito ao conjunto dos técnicos e agentes penitenciários. Muitos deles são profissionais dedicados e honestos e há aqueles que, de fato, se importam com os internos. O fato incontornável é que o sistema produz monstruosidades que são extremamente funcionais à reprodução ampliada do crime. Tudo o que foi dito na série de ZH é a “ponta do iceberg” e situações muito mais graves ainda virão à tona. O que importa, então, é a coragem de extrair do diagnóstico as conclusões devidas.
A mais importante delas: seguir com uma política criminal que produz prisões em massa é uma das formas mais eficientes para estimular o crime e a violência no Brasil. Pois é precisamente esta conclusão que não será obtida, porque ela pressupõe o desafio de pensar de outra forma os desafios da segurança pública e nossos governantes têm coisas mais urgentes a pensar como, por exemplo, as próximas eleições.
Tramita no Congresso Nacional proposta de emenda constitucional (PEC 380) que pretende criar uma “polícia penitenciária” ou “polícia penal” a partir da simples transposição de cargos dos atuais agentes penitenciários. A matéria, que está pronta para votação e que conta com amplo apoio entre os partidos e com a omissão do Governo Federal, assinala erro de dimensões históricas. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) aprovou por unanimidade parecer que redigi contrário à matéria (disponível aqui), mas a demagogia reinante à direita e à esquerda está prestes a cometer o desatino, sem que a opinião pública tenha sequer uma ideia do que se trata. No RS, por outro lado, o mesmo governo que nomeou para a Corregedoria da SUSEPE e para a Direção Geral do órgão servidores acusados por delitos gravíssimos; que descumpriu sistematicamente as recomendações dos Promotores e Magistrados que atuam na área da execução, que nunca desenvolveu qualquer esforço para reformar o sistema, e excluir dele os “bandidos de carteirinha” (pelo contrário, tratou de promovê-los), fala, agora, ao apagar das luzes de seu triste mandato, em “novo paradigma para o sistema prisional”, sem corar de vergonha e sem recolher como resposta o merecido desprezo.
Tolstói e Mandela afirmaram que só se conhece verdadeiramente uma sociedade quando entramos em suas prisões. Tinham toda razão. Poderiam acrescentar: se queremos conhecer um governo basta saber o que ele faz em suas prisões.
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