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domingo, 25 de abril de 2010
Rio quer UPPs nos "quartéis do crime"
Para especialistas, Polícia Pacificadora é "uma gota d’água no oceano e deve ser replicada em outros locais"
Escolhida como sede de eventos importantes, como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, a cidade do Rio de Janeiro tem estado frequentemente sob a mira de críticos que acham que a capital fluminense não estará preparada para ser palco desses acontecimentos. Problemas para serem resolvidos são inúmeros e, entre eles, está a questão da segurança pública – ponto crítico para uma cidade constantemente associada às belezas naturais e também, infelizmente, a casos de violência urbana de grande repercussão. Projetos recentes das autoridades policiais – como as Unidades de Polícia Pacificadora –, no entanto, mostram um caminho possível na luta para a redução dos índices criminais.
O projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) foi concebido para que o Estado retomasse o controle territorial de comunidades dominadas pelo tráfico de drogas ou pelas milícias. Atualmente, o modelo está implantado nas favelas Dona Marta, Jardim Batam, Cidade de Deus, Chapéu Mangueira-Babilônia, Cantagalo-Pavão Pavãozinho e Ladeira dos Tabarajaras. De acordo com o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, até o final de 2010, mais nove comunidades serão pacificadas. Entre elas, está a UPP do Morro da Providência, no centro, que será inaugurada nesta segunda-feira. “Esse programa é da sociedade e vamos entregar para ela. A polícia chegou e vai ficar. Essa é uma política de Estado, não de governo”. Com as novas ocupações, o Rio contará no total com 15 UPPs que utilizarão um efetivo de 3.850 policiais, beneficiando cerca de 210 mil moradores de 59 comunidades.
O projeto é ainda mais ambicioso e tem como metas para o futuro chegar a favelas tidas como quartéis do crime, como os complexos do Alemão e de Manguinhos. “Nós sabemos onde queremos chegar e vamos chegar ao Alemão. Sabemos que a região é complicada, mas temos que cumprir nosso projeto e mostrar os resultados para a sociedade”, disse Beltrame, sem fixar prazos.
Troca de armas
Paralelo ao projeto das UPPs, outras ações têm sido tomadas visando a uma melhor capacitação das polícias Militar e Civil. De acordo com a secretaria estadual de Segurança, ainda neste semestre, os policiais militares das favelas pacificadas irão trocar fuzis por carabinas. Para a corporação, os fuzis são considerados mais devastadores devido às diferenças de calibre. A mudança também irá ajudar a solucionar casos de balas perdidas. Com o armamento diferente dos criminosos, a polícia poderá descobrir de onde partiu o disparo. Os soldados das favelas pacificadas também passarão a utilizar armas não-letais em ações turbulentas onde não haja criminalidade aparente, como rixas entre pessoas e protestos. Entre as armas que serão utilizadas, estão teasers (armas de pulsos eletromagnéticos), gás de pimenta, granadas de efeito moral e agentes lacrimogêneos.
“A ideia do armamento não-letal é dar mais uma opção aos policiais. Em um segundo momento, pretendemos substituir os fuzis dessas comunidades pacificadas por carabinas ponto 30. Estamos quebrando o paradigma de território imposto por armas de guerra e, por isso, nós como Estado podemos retirar os fuzis dessas unidades pacificadas”, avaliou Beltrame.
Investindo em uma linha de inteligência na investigação, a Polícia Civil inaugurou em fevereiro a Divisão de Homicídios da capital que tem como meta dar prioridade às diligências locais dos crimes nas primeiras 48 horas. A divisão conta com oito delegados e 250 policiais, 120 deles recém formados na Academia de Polícia. Há ainda seis peritos criminais, seis papiloscopistas e, diariamente, um médico legista do Instituto Médico Legal (IML) acompanha a equipe.
Segundo a secretaria estadual de Segurança, ainda em 2010, a Divisão de Homicídios vai ganhar unidades em Niterói e na Baixada Fluminense. “Homicídio agora vai ser tratado de forma qualificada e com isso esperamos reduzir os índices no Rio de Janeiro”, explicou o chefe de Polícia Civil do Rio, delegado Allan Turnowski, na inauguração da divisão da capital.
Números e opiniões
Dados divulgados na última segunda-feira pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram uma redução no Estado do Rio de Janeiro no número de ocorrências de quatro crimes – estabelecidos pela secretaria de Estado de Segurança como indicadores estratégicos. Segundo o estudo, no mês de fevereiro de 2010 foram registrados menos 83 homicídios dolosos em relação ao mesmo período em 2009, uma redução de 14,9%. O número de vítimas, segundo o ISP, é o menor dentre os períodos semelhantes em toda a série histórica disponível desde 1991.
Em relação aos latrocínios (roubo seguido de morte), houve uma queda de 13 vítimas. Os números de roubos a veículos apresentaram uma redução significativa de 26,5%, menos 628 casos em relação ao mês de fevereiro de 2009. Já o índice de roubo de rua, que engloba assaltos a transeuntes, roubos de celular e dentro de coletivos, apresentou redução de 16%, com menos 1.237 ocorrências. Foram 6.489 casos em fevereiro de 2010 e 7.726 no mesmo período do ano passado. Para o ex-secretário nacional de Segurança Pública, coronel José Vicente da Silva Filho, entre as ações tomadas no Rio, a que merece destaque é a atuação da Divisão de Homicídios. “A melhor maneira para solucionar crimes é dar instrumentos de qualidade aos agentes. Isso melhora a capacidade de investigação, dando resultado na redução criminal. É um caminho que oferece uma resposta imediata e eficiente”, avaliou.
O especialista, no entanto, refuta a concepção das UPPs. Para ele, o projeto pode ter um bom resultado na comunidade beneficiada, algo visto como pontual. Segundo Silva Filho, as unidades pacificadoras não podem ser vistas como uma solução porque seria logisticamente impossível estender o modelo para um Rio com mais de mil favelas. “A UPP é um novo rótulo para uma velha bebida. É um instrumento temporário e o Rio possui problemas mais sérios para serem resolvidos. Há uma carência no Estado de um planejamento de segurança global”, disse o coronel.
Mesmo com a dificuldade de extensão do projeto, a inauguração das UPPs é visto com bons olhos por outros especialistas ouvidos. “São uma via promissora, combinando policiamento comunitário com investimentos sociais”, afirmou o antropólogo Luiz Eduardo Soares, também ex-secretário nacional de Segurança Pública. “Ainda é cedo para ter uma conclusão, mas está claro que a presença da polícia desestimula a luta entre quadrilhas, dando estabilidade aos locais”, completou o sociólogo Ignácio Cano, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. A socióloga Julita Lemgruber, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), da Universidade Candido Mendes, fez coro: “devemos aplaudir o projeto, é uma gota d’água no oceano e deve ser replicado em outros locais”.
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