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segunda-feira, 5 de julho de 2010
Traficante compra granadas e ordena atentados da prisão
Gravações obtidas com exclusividade pelo Fantástico mostram como um dos bandidos mais perigosos do país mantém sua atividade criminosa mesmo preso.
Tráfico de drogas, compra de granadas, assassinatos. Gravações obtidas com exclusividade pelo Fantástico mostram como um dos bandidos mais perigosos do país mantém sua atividade criminosa mesmo dentro de um presídio de segurança máxima. É mais um escândalo que põe em xeque o nosso sistema carcerário.
Um resgate de gelar o sangue. Imagens chocantes, exibidas pelo Fantástico em 2002, mostram o fim do sequestro de duas irmãs em Americana, São Paulo. O mentor do crime foi um dos bandidos mais violentos do país: Wanderson de Paula Lima, o Andinho.
Vinte sequestros confirmados, roubos, tráfico de drogas, assassinatos. A longa ficha de Andinho, preso há oito anos, levou a uma das maiores condenações do Brasil: mais de 500 anos de cadeia. Mas isso não impediu que ele continuasse sua atividade criminosa.
Mesmo atrás das grades, na penitenciária de segurança máxima de Presidente Venceslau, oeste paulista, Andinho manteve contato com seus comparsas em outros presídios e também nas ruas. É o que revelam gravações feitas com autorização da Justiça no início de 2009 e obtidas com exclusividade pelo Fantástico.
“Nós acabamos apurando que ele ainda possuía controle sobre alguns pontos de tráfico de drogas de Campinas. Tudo por telefone”, comenta o delegado Eduardo Miraldi.
Em conversa com um traficante não-identificado, Andinho manda adicionar outras substâncias à cocaína, para aumentar o lucro.
Andinho: Pega "umas" cem gramas, põe "umas" vinte de bicarbonato, tenta fazer, coloca um copo de álcool, aquele esquema lá, mano. Vê aí, tenta fazer qualquer coisa, vai deixar o bagulho do jeito que está? Tá ruim, parou e já era?
Janeiro de 2009: bandidos a serviço de Andinho atacam a sede do jornal "Correio Popular", em Campinas, e jogam duas granadas. O sequestrador não tinha gostado de uma reportagem com detalhes de sua vida pessoal.
“Ele resolveu, então, se vingar do jornal”, diz o delegado.
As granadas não explodiram. Como o ataque ao jornal não teve sucesso, Andinho ficou irritado e resolveu planejar um novo atentado. Desta vez, contra a própria jornalista que fez a reportagem. A trama foi gravada pela polícia.
Bodão: Vai dar continuidade naquela festa lá?
Andinho: Vamos, só tô arrumando o caminho certo lá, entendeu?
Em outra ligação, o bandido pede que sua advogada, Maria Odete Haddad, busque informações sobre a jornalista.
Andinho: Eu precisava do endereço daquela pessoa, doutora. Não é negócio de inocente, não tem nada de inocente, entendeu, doutora?
Maria Odete: Vai ter que esperar um pouquinho.
Andinho: É?
Maria Odete: Um mês, mais ou menos.
Os dois se despedem carinhosamente.
Maria Odete: Um beijo. Te amo, viu?
Andinho: Também. Tchau, tchau.
O plano de vingança foi desfeito pela polícia e a advogada, presa.
Se a polícia não agisse rapidamente, a jornalista poderia ter morrido, garante a polícia.
Em fevereiro deste ano, Andinho foi levado para um fórum de Campinas. Durante uma hora, acompanhado de advogados, confessou vários crimes com riqueza de detalhes.
No depoimento, ele assumiu a autoria do atentado contra o jornal e admitiu que, dentro da prisão, comandava a venda de drogas na região de Campinas.
“Como ele já tem uma condenação bastante extensa, ele resolveu assumir para tentar, de certa forma, tirar a responsabilidade dos demais autores do delito”, avalia o delegado.
O bando do sequestrador sabia que estava sendo monitorado. Por isso, Andinho usava códigos para negociar armas.
Andinho: Não, vassoura, não. Deixa o bico, né, só o bico.
"Vassoura" quer dizer metralhadora, e "bico", fuzil. Mas às vezes nem eles se entendiam.
Andinho: Eu queria que ela fosse buscar cinco "negócios" pra mim ali, cinco "limãozinho".
Traficante: "Vixe", nem sei o que é isso.
Andinho: Cinco abacaxizinho.
Traficante: É grande ou pequeno?
Andinho: Não, é pequenininho.
Traficante: Depois você manda uma "mensaginha" falando o nome desse negócio que eu não sei o que é isso, não.
Andinho: É granada, "fio".
Traficante: Ah, entendi.
Andinho: É cinco granadas.
Mas como um bandido tão perigoso teve acesso a celulares dentro do presídio de segurança máxima de Presidente Venceslau?
“Na verdade, esse não é um caso isolado. É uma infeliz realidade nacional. É visto como o grande problema no combate ao crime organizado”, afirma o promotor Amauri Silveira Filho.
Há dois anos, o Fantástico revelou que até crianças estavam sendo aliciadas para levar aparelhos escondidos, como contou uma adolescente, na época com 13 anos.
“Eu tinha muita vontade de conhecer a cadeia. Acabei me empolgando e levei”, contou na época.
No mercado negro, os detentos pagam até R$ 2 mil por um telefone.
A Secretaria da Administração Penitenciária garantiu, em nota, que tem uma política de tolerância zero para a entrada de celulares, e que investiu R$ 34 milhões em aparelhos de raio-x e detectores de metais.
Para o Ministério Público, porém, as medidas não têm sido suficientes para impedir a comunicação entre os criminosos.
“Eles continuam fazendo exatamente o que faziam enquanto estavam na rua. Ou seja: coordenando e gerenciando a ação de seus subordinados. A única diferença é que quando preso ele já não tem gasto nem com moradia e nem com comida, porque é tudo custeado pelo estado”, acusa o promotor Amauri Silveira Filho.
Por causa do atentado ao jornal, Andinho foi punido e passou um ano isolado, sem privilégios. Em abril, o sequestrador voltou ao convívio com os outros presos. A pena de Andinho, que já ultrapassa meio milênio, pode aumentar ainda mais depois que esses novos crimes forem julgados.
Andinho: É nós, parceiro. Nós estamos nesse número aí, ó. Nós vamos ficar na sintonia, se precisar de mim pode contar comigo, tá ligado em qualquer situação, falou?
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