
Cidade mantém base de dados de homicídios com endereço e data do crime
Secretaria de Defesa Social de Minas Gerais afirma que o objetivo da medida é dar transparência e nortear possíveis ações com ONGs
BRENO COSTA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE
Belo Horizonte é, desde o último dia 11, a primeira capital brasileira a dar acesso ao público, pela internet, a um mapa com os locais exatos de homicídios registrados na cidade.
A Secretaria de Defesa Social de Minas Gerais afirma que o objetivo da medida é dar transparência à base de dados que já é analisada pela polícia internamente, há mais de dois anos.
Apesar disso, o secretário Maurício Campos diz que pode tirar a ferramenta do ar caso não haja "uma real contribuição para o sistema de defesa e para a comunidade em geral".
O que ele diz esperar é a ação de "parceiros", como ONGs, universidades e prefeitura, de forma que, uma vez indicados os focos de homicídios na cidade, eles possam complementar a ação do Estado por meio de sugestões ou ações práticas.
Caso passe no teste, o mapa trará dados sobre toda a região metropolitana de Belo Horizonte a partir de 2010.
A iniciativa é elogiada por estudiosos da área de criminalidade e foi inspirada em práticas adotadas em cidades como Los Angeles e Londres.
O sistema funciona de forma simples. A partir de imagens de satélites do Google, são indicados, mês a mês, os pontos onde foram registrados homicídios em Belo Horizonte.
Ao todo, de 550 homicídios registrados de janeiro a setembro deste ano na capital, segundo o governo, 513 estão georreferenciados.
O mapa permite concluir que os homicídios estão espalhados pela capital, mas que os pontos de maior concentração são áreas próximas a favelas e zonas limítrofes a outras cidades da região metropolitana.
Pesquisadores de MG, SP e RJ consultados pela Folha são unânimes ao elogiar a medida, mas alertam que o mapa não traz melhorias automáticas na segurança pública. Essa melhoria viria da cobrança, agora mais embasada, de ações por parte das autoridades.
"Para nossas corporações, eu não tenho dúvida de que isso é uma exposição e cobrança", afirma Maurício Campos.
Coordenadora de uma ONG com atuação em favelas de BH, a antropóloga Clarice Libânio afirma que não vê "aplicabilidade prática" da divulgação e não descarta o risco de uma estigmatização ainda maior de determinadas regiões.
O sociólogo Ignácio Cano, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, diz que o risco de estigmatização sempre foi debatido, mas isso não pode justificar a não divulgação.
"Não faria sentido ocultar os dados de violência em favelas só para evitar a estigmatização. O que a gente tem que fazer é divulgar esses dados e adotar políticas para que isso [estigmatização] não aconteça."
Maurício Campos diz que se for constatado que o mapa está prejudicando a imagem de determinadas regiões, pode recuar na divulgação dos dados.
São Paulo e Rio descartam divulgação de assassinatos
Estados dizem não haver necessidade de abrir banco de dados ao público
Secretaria paulista afirma que Promotoria, prefeitos de cidades conveniadas e as guardas municipais já têm acesso a todos os números
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE
São Paulo e Rio de Janeiro, capitais que lideram o ranking absoluto de homicídios no país, não têm planos de divulgar seus dados georreferenciados de crimes, usados para planejamento interno.
Em São Paulo, funciona desde 1999 um sistema avançado, chamado Infocrim. Ele é usado para planejamento de ação da polícia, abrangendo o registro eletrônico e localização geográfica de crimes em 372 municípios do Estado, segundo a Secretaria da Segurança Pública.
O sistema foi implantado inicialmente na capital. Entre 2001 e 2003, foi expandido para toda a Grande São Paulo e, nos anos seguintes, para cidades do interior. A secretaria não explicou a razão de os dados georreferenciados não serem divulgados na internet, mas diz que há transparência.
O órgão afirma que Ministério Público e prefeitos de municípios conveniados, assim como as guardas municipais dessas cidades, têm acesso aos dados, que incluem não só homicídios, mas outros crimes como roubos e furtos.
Os governadores de São Paulo e Minas Gerais, os tucanos José Serra e Aécio Neves, são pré-candidatos à Presidência da República e disputam a indicação do PSDB para a corrida sucessória.
No Rio, a Secretaria de Segurança diz que "está sempre atenta a novidades na segurança pública", mas que "não há previsão de implantar este sistema georreferenciado no Estado". O órgão também não explicou suas razões.
A secretaria afirma que, apesar disso, o Rio é o Estado "com maior transparência nos índices de criminalidade no Brasil", com a divulgação mensal de 39 índices criminais.
Favelas e bairros em áreas na divisa concentram casos
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE
Os homicídios em Belo Horizonte são registrados, majoritariamente, em regiões próximas a favelas e em zonas de divisa com outros municípios da região metropolitana. É o que aponta o mapa de homicídios.
Na região centro-sul, que possui favelas, mas onde se concentram os bairros de classe média alta de BH, a reportagem contou 43 homicídios entre janeiro e setembro. Em zonas periféricas, como as regiões do Barreiro e Venda Nova, o mapa indica 132 mortes.
Fora das áreas de favelas, a reportagem também constatou incidência repetida de homicídios. É o caso, por exemplo, da avenida do Contorno, nas imediações da rodoviária de Belo Horizonte e da estação de metrô Lagoinha.
Na avenida e em uma rua transversal, bem em frente ao portão de entrada dos ônibus na rodoviária, três pessoas foram mortas este ano.
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