sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Emendas e falta de transparência em SP

É vexatória a situação na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), com a decisão de enterrar as investigações sobre o esquema de venda de emendas na Casa, trazido à luz pelo deputado Roque Barbiere (PTB), da base aliada do governador Geraldo Alckmin. Segundo o deputado, pelo menos 30% dos 94 deputados estaduais paulistas integram o esquema.

O tratamento dado pelo governo paulista, pelos tucanos e pela mídia ao esquema revela que só interessam as apurações no plano federal. Caso contrário, haveria estardalhaço com a decisão do Conselho de Ética da Alesp e com a lentidão com o MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo), que instaurou investigação que até agora não trouxe contribuição para esclarecer o esquema.

Aliás, é muito difícil ver o MP-SP atuar com empenho e agilidade quando se trata do governo estadual.

As apurações foram enterradas na Alesp antes mesmo do depoimento da primeira testemunha do balcão de negócios, Teresinha Barbosa, dirigente de uma ONG (Organização Não Governamental) na capital.

Há também o objetivo de evitar a convocação do secretário estadual do Meio Ambiente, Bruno Covas (PSDB), pré-candidato preferido do governador Alckmin à prefeitura paulistana na eleição de 2012.

Tão logo Barbiere denunciou o esquema, Bruno Covas deu entrevista dizendo ter recebido, quando deputado estadual, proposta de propina. Mas ele teria recusado e orientado a doação do dinheiro a uma santa casa, sem tomar as devidas providências que um funcionário público deve tomar — a primeira delas, levar o episódio ao conhecimento público e das autoridades.

Apenas o PT se recusou a apoiar o término das investigações. E, mais uma vez, prevalecerá a obscuridade na Alesp, que não leva adiante uma investigação por conta das manobras da base aliada tucana.

Os governos tucanos já enterraram mais de 60 pedidos de CPI nos20 anos em que governam o Estado. O caso da venda de emendas, contudo, é emblemático porque desmascara o tucanato, que, atingido, faz tudo ao contrário do que prega.

No plano nacional, posam de vestais, arautos da probidade. Mas o posicionamento em São Paulo permite entender que a lógica é uma só: se for contra o governo federal, é escândalo; se for contra os governos tucanos, dentro da normalidade.

O mesmo acontece com representantes de outros Estados, como o senador Aécio Neves (PSDB-MG), que acusa o governo federal de ser complacente com irregularidades e só agir após as denúncias na imprensa. Em contrapartida, os tucanos nem quando aparecem as denúncias agem.

O próprio Aécio se calou diante das denúncias feitas contra tucanos de todo Brasil. O que disse ou fez em relação à venda de emendas na Alesp? E em relação ao ex-governador Leonel Pavan(SC), indiciado por irregularidades e tráfego de influência? E sobre o senador Mário Couto (PSDB), que responde por malfeitos à época em que presidiu a Assembleia Legislativa do Pará? Silêncio.

É evidente que é preciso apuraras suspeitas de irregularidades, em todos os níveis de governo, mas indo a fundo e trazendo explicações à sociedade. No entanto, o crucial para um governo com compromisso de combate à corrupção é criar e aperfeiçoar os mecanismos de controle e transparência. Talvez a maior referência nesse sentido seja a criação da CGU (Controladoria Geral da União), no primeiro mandato do Governo Lula. De lá, saíram inúmeras investigações sobre o uso do dinheiro público.

Esse belo trabalho, iniciado com Waldir Pires e que foi aprofundado por Jorge Hage, tem um elemento decisivo: a transparência. Essa preocupação tem norteado os órgãos federais, que cada vez mais permitem o acompanhamento online de suas ações, para fiscalização pela imprensa e demais cidadãos.

Faltam aos governos estaduais tucanos adotarem os mesmos procedimentos. Só depois de muita pressão é que Alckmin anunciou a intenção de dar publicidade às emendas da Alesp.

Mas essa deveria ser uma iniciativa ampla, que valesse para o conjunto da administração estadual. Afinal, a persistir o tratamento que hoje é dado às informações relativas ao governo estadual, o combate à corrupção no interior da máquina pública seguirá engatinhando. Isso precisa mudar.

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Após o choque pela notícia do câncer do ex-presidente Lula, uma onda de solidariedade se formou por sua recuperação. Por sua liderança, pelo que representou para o país, por sua identidade com os historicamente desfavorecidos, por sua sensibilidade social, por sua história de vida e por nossa amizade, tenho certeza de que Lula irá superar mais essa adversidade. Estamos com você, Lula!



José Dirceu, 65, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT

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