quinta-feira, 25 de novembro de 2010

RIO SOB ATAQUE

Confrontos se acirram e Rio tem 19 mortes

Polícia intensifica as ações em favelas em mais um dia da onda de ataques promovida por facções criminosas


A guerra entre traficantes e o governo do Rio de Janeiro se acirrou ontem, no quarto dia de ataques: confrontos entre policiais e criminosos deixaram 19 mortos, entre eles uma adolescente vítima de bala perdida. Ao menos 31 carros foram queimados. Desde domingo, são 27 mortos e 43 veículos incendiados.
Os ataques aumentaram, em especial na zona norte, e a insegurança se espalhou por toda a cidade. Na Vila Cruzeiro, dezenas de traficantes foram filmados ao atirar em direção à polícia. Na mesma região, um veículo blindado do Bope (tropa de elite da PM) foi atacado e teve de recuar.

4º dia de ataques tem 31 veículos queimados

Garota de 14 anos morreu atingida por tiro nas costas durante ação policial na Vila Cruzeiro

Governador Sérgio Cabral diz que onda criminosa é "desespero de marginais" e que UPPs vão continuar


DO RIO

No quarto dia da onda de ataques criminosos no Estado do Rio, 19 pessoas foram mortas, quatro delas durante ação do Bope na Vila Cruzeiro (zona norte), considerada o principal reduto de traficantes na cidade.
Entre as vítimas está Rosângela Barbosa Alves, 14, atingida por um tiro nas costas durante a incursão da tropa de elite da PM do Rio.
Além da garota, as outras três vítimas da Vila Cruzeiro levadas para o hospital estadual Getúlio Vargas e que acabaram morrendo são: Janaina Romualdo dos Santos, 43, Rafael Felipe Gonçalves, 29, e um homem identificado como Geraldino, aparentando entre 60 e 70 anos.
A PM não tem informação de que eles tivessem alguma ligação com o tráfico.
Desde domingo, já são 27 os mortos no Rio. Desses, 15 morreram em confronto com a polícia, nas 13 ações de ontem em 28 favelas.
Para o hospital, também foram levados moradores feridos na Vila Cruzeiro, como Valdete Carvalho, 33, que levou um tiro na barriga.
Desde domingo, 43 veículos foram incendiados- 31 apenas ontem, dia em que os ataques se intensificaram.
Às 23h40, o motorista de um ônibus foi baleado na avenida Brasil, na Penha (zona norte). O veículo foi incendiado. Em Mesquita, na Baixada Fluminense, outro ônibus foi queimado.
Em Vicente de Carvalho (zona norte), um bilhete foi achado em um dos ônibus incendiados: "Se continuarem as UPPs, não vai ter Copa e nem Olimpíada".
Foram detidos 31 suspeitos -são 159 presos desde segunda. Houve a apreensão de 17 pistolas e revólveres, 9 fuzis, 1 espingarda, 1 submetralhadora, 1 granada, 2 bombas caseiras, mais de 1 t de drogas (maconha, cocaína e crack) e material inflamável.
O governador Sérgio Cabral (PMDB) afirmou ao "Jornal Nacional" que a Marinha dará apoio no combate aos ataques na Vila Cruzeiro. Segundo ele, não haverá ação de militares, mas "apoio logístico com transporte, viaturas e equipamentos".
Disse que os ataques são "um ato de desespero" porque os criminosos estão "enfraquecidos e perdendo território". "Não vão nos inibir. Vamos seguir com o trabalho de pacificação de diversas comunidades", disse à CBN.
As ações continuam hoje. Estão de prontidão 17,5 mil homens da PM. (CIRILO JÚNIOR, DIANA BRITO, FABIA PRATES, FELIPE CARUSO e HUDSON CORRÊA)

Após caveirão ser atingido, Bope recua

CIRILO JUNIOR
DO RIO

O temido Bope (Batalhão de Operações Especiais da PM), tropa de elite da polícia carioca, foi atacado ontem por traficantes e teve de recuar.
No final da tarde, 50 homens do batalhão, com o caveirão à frente, entraram na Vila Cruzeiro, uma das quatro favelas do Complexo da Penha (zona norte) que foram alvo de operações policiais ontem.
Uma hora depois, o carro blindado voltou da favela com um princípio de incêndio provocado por coquetéis molotov e três de seus seis pneus furados.
Do alto da favela, os traficantes monitoravam a subida do blindado. "É do pequeno, hein", mencionava um dos traficantes pelo rádio. Ele se referia ao modelo menor do caveirão, que comporta até 12 homens.
Ao saírem do caveirão, os policiais apagaram o fogo na parte da frente do blindado. Eles demonstravam estar assustados e surpresos com a reação dos bandidos.
"Caraca, meu irmão, quase incendiaram o blindado. Ainda bem que o motorista era bom", dizia um dos soldados do Bope. Terminava ali a invasão do Bope na região.

Traficantes põem fogo em van com 14 pessoas; 4 ficam feridas

"Entramos em pânico e saímos correndo", afirma o motorista de 68 anos

Onda de ataques causa medo em moradores das regiões atingidas; comércio fica aberto, mas circulação diminui


FABIA PRATES
FELIPE CARUSO
DO RIO

Por volta das 6h30 de ontem João Guilherme Seixas de Souza, 68, viveu a pior experiência em 12 anos de trabalho como motorista de van na zona oeste do Rio.
Dois homens entraram no veículo e anunciaram um assalto. Em vez de roubar o dinheiro dos passageiros, espalharam gasolina e atearam fogo no veículo, sem ordenar que seus 14 ocupantes saíssem -além de Souza e da cobradora Eliane Cardoso, 39, havia 12 passageiros. Quatro tiveram ferimentos leves.
Para fugir das chamas, Souza abriu a porta e quase morreu atropelado ao correr pela estrada Urucânia. Ele sofreu queimaduras nos tornozelos e nos braços. "Todos os passageiros ficaram em pânico. Saímos correndo com medo de morrer."
Souza ajudou a colega Eliane a escapar do carro em chamas. Ao sair, ela ficou caída na pista ao lado do veículo, com os pés queimados. "Tive que arrastá-la." Apesar do susto, ele não pensa em abandonar o trabalho.

CLIMA DE MEDO
A onda de ataques que acontecem no Rio desde o fim de semana criou um clima de medo na cidade, principalmente nas regiões onde os incêndios ocorreram.
O comércio continuou aberto, mas a circulação de pessoas era menor do que em dias normais nas ruas de Santa Cruz e Paciência.
Vizinhos na zona oeste, os dois bairros foram palco, ontem de manhã, de dois ataques -com saldo de quatro pessoas feridas e dois veículos, a van e um ônibus, destruídos pelo fogo.
Houve redução do número de veículos que fazem o transporte alternativo entre Campo Grande e Urucânia, trajeto de 13 km no qual ocorreu o ataque à van dirigida por Souza. Segundo Leandro da Silva, 30, dono do veículo, a cooperativa tirou todos os seus 13 carros tirou circulação com medo de ataques.
O carro sofreu perda total e Silva não sabe se o seguro cobrirá o prejuízo. Ele, que tem duas vans, vai processar o Estado. "Logo agora que a gente esperava aumento do movimento por causa do Natal." Cada veículo rende por dia cerca de R$ 300.

Ação publicitária gera suspeita de bomba e para Ipanema

RODRIGO RÖTZSCH
DO RIO

Uma ação publicitária sem noção de "timing" gerou ontem apreensão e transtorno em Ipanema, zona sul do Rio.
Duas grandes caixas de madeira, trancadas com cadeados, foram abandonadas nas duas principais praças do bairro, Nossa Senhora da Paz e General Osório.
No segundo caso, o objeto foi deixado a poucos metros de uma cabine de polícia, alimentando temores de que fosse uma bomba.
As caixas eram, na verdade, parte de ação publicitária da empresa P&G para divulgar uma promoção vinculada ao programa "Domingão do Faustão", da TV Globo.
Isso só foi revelado, porém, depois que o trânsito da Visconde de Pirajá, mais movimentada rua do bairro, foi desviado e o esquadrão antibombas da Polícia Civil foi ativado para detonar as duas caixas. A polícia exigirá ressarcimento da P&G pelos custos da operação.
Em nota, a empresa disse "lamentar profundamente pelo desconforto causado à população" e informou que a ação foi suspensa.
Apesar do susto, a população que acompanhou o desarme da "bomba" na General Osório reagiu ao episódio com mais sarcasmo do que medo. "A senha [do cadeado] é UPP!", gritou um homem.
Quando um policial mascarado do esquadrão antibombas chegou para instalar a garrafa com um líquido explosivo que seria usada para forçar a abertura da caixa, alguém gritou: "É o Mr. M!", em alusão ao mágico que fez sucesso no "Fantástico".
Os curiosos tiveram que deixar a praça para que a caixa pudesse ser aberta. Mas, do outro lado da rua, iniciaram uma contagem regressiva após a polícia acender o pavio da garrafa.
Um funcionário do metrô resumiu a situação a um homem que chegava da estação que fica na praça e perguntou o que havia na caixa: "Nada. Vento".

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