segunda-feira, 19 de abril de 2010

Corrupção nas cadeias de RS: o colapso nas prisões gaúchas

Em meio a celas superlotadas e longe da fiscalização da sociedade, alguns agentes penitenciários subornam, facilitam acesso a armas e a celulares e torturam presos

Carlos Etchichury e Juliana Bublitz - do Zero Hora

Dentro das cadeias gaúchas, protegidos pela cumplicidade de presos e de seus familiares, agentes penitenciários gaúchos são acusados de vender drogas e celulares, liberar apenados sem autorização judicial e extorquir e torturar presidiários.

Face oculta do caos instalado nas decrépitas e superlotadas penitenciárias do Rio Grande do Sul, a realidade não se restringe às celas: ultrapassa muros e grades e repercute na vida de inocentes, fora das prisões, em todo o Estado.

Investigações desencadeadas por órgãos como Ministério Público, Polícia Civil e Polícia Federal demonstram que as ações ilícitas de alguns servidores da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) contribuem, direta e indiretamente, para a multiplicação de crimes como homicídios, furtos e roubos.

A maior parte dos casos, porém, sequer é investigada. Já que os delitos praticados pelos funcionários das cadeias gaúchas têm criminosos como vítimas ou comparsas, raramente chegam ao conhecimento das autoridades. Quando chegam, não são prioritários.

Caberia à Susepe coibir abusos e punir ilícitos no cárcere. Mas a estrutura da superintendência, ancorada nos anos 60, década de sua criação, conspira a favor da impunidade. Na Susepe, nada impede que o corregedor de hoje, responsável por reprimir desvios e depurar o órgão, seja o carcereiro de amanhã, abrindo e fechando celas no fundo de uma galeria, ombro a ombro com um colega por ele investigado.

O resultado é uma corregedoria permissiva, que pune condutas suspeitas transferindo funcionários – foi o que aconteceu com um agente indiciado pela Polícia Federal suspeito de participar de uma quadrilha de furto e roubo de veículos desarticulada no Estado. É um exemplo, mas há dezenas de situações semelhantes.

Medidas drásticas, como demissões, são incomuns. Em uma década, apenas 12 agentes foram expulsos num universo de 2,5 mil concursados. Para efeito de comparação, em igual período a Polícia Civil, com 5 mil integrantes, expurgou da corporação 165 maus policiais – um número sete vezes superior.

– A nossa legislação é diferente. Há uma sindicância e, posteriormente, o processo é enviado para a Procuradoria-geral do Estado (PGE), que decide sobre a demissão. Creio que foge da nossa atribuição eu afirmar o porquê de as demissões serem menores no sistema penitenciário. Em média, são instaurados entre 250 e 350 procedimentos por ano. Nos últimos cinco anos, 419 servidores sofreram algum tipo de punição – diz o corregedor-geral da Susepe, Homero Diógenes Negrello.

É nesse contexto que proliferam extorsões, achaques e espancamentos, como o ocorrido semana passada na Penitenciária Regional de Caxias do Sul. Flagrada pelas câmeras de vídeo da própria instituição, as imagens de agentes torturando presos abalaram a prisão que a Susepe considera modelo no Estado.

São tantas as denúncias que promotores da Vara de Execuções Criminais (VEC) da Capital decidiram agir. Até 2008, eles informavam à Polícia Civil, à corregedoria e à colegas do MP que atuam nas áreas criminais sobre os indícios de crime. Com exceções, a apuração era pífia. Agora, eles mesmo investigam.

O resultado, ainda tímido, já é percebido. No ano passado, 10 agentes foram presos e pelo menos 30 denunciados. De hoje a terça-feira, Zero Hora revela, em uma série de reportagens, como o crime corrói o cárcere.

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