terça-feira, 30 de março de 2010

Política de bônus para professores divide pesquisadores



Em greve há três semanas, os docentes não têm aumento desde 2008; reajustes ficaram abaixo da inflação nos últimos cinco anos

Para alguns, bônus beneficia só os que já possuem boas condições de trabalho; outros dizem que categoria será forçada a melhorar


FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL

A política do governo de São Paulo de conceder reajuste salarial apenas aos professores bem avaliados divide os pesquisadores da área.
Uma ala diz que a lógica beneficia apenas os que já possuem boas condições de trabalho. Outra defende que os educadores serão forçados a melhorar.
Em greve há três semanas, os docentes estaduais não ganham aumento desde 2008. E nos últimos cinco anos os reajustes ficaram abaixo da inflação.
A Secretaria da Educação diz que os gastos com a folha salarial já são muito altos (cerca de 70% de todo o orçamento da pasta) e que prefere conceder dinheiro extra aos servidores de escolas que melhorem os indicadores de qualidade ou que passem em exames.
Desde 2005 (quando receberam aumento de 15%) os professores das escolas estaduais paulistas ganharam apenas um reajuste, de 5%, em 2008. A inflação nos últimos cinco anos foi de 22% (IPCA-IBGE).
Hoje, os salários dos professores variam de R$ 1.834 a R$ 3.181 (para 40 horas semanais).
Para os sindicatos, os salários estão "sucateados". O movimento reivindica aumento de 34,3%, índice que recuperaria as perdas desde 1998.
O governo José Serra (PSDB) afirma que a situação não é ruim como dizem os sindicalistas, pois houve incorporações de gratificações (que beneficiam sobretudo os aposentados) e implementação do bônus por desempenho, pago em uma parcela a servidores de 73% das escolas (a maioria ganhou de R$ 2.500 a R$ 5.000).
Foram beneficiados os colégios que melhoraram em um ano o desempenho no indicador de qualidade ou ficaram acima da média da rede.
O governo também adotou programa que eleva o teto a R$ 6.270, desde que o servidor, ao final da carreira, tenha sido aprovado em quatro exames.
"Não suportaríamos o aumento pedido pelos sindicatos. Por isso estamos com política de bônus, de promoções", afirmou o secretário-adjunto da Educação, Guilherme Bueno.
A pasta diz que, se concedido o reajuste, faltariam recursos para ações como manutenção de escolas ou compra de materiais (a folha salarial passaria a 86% do orçamento da pasta).
A secretaria afirma ainda que os recursos destinados a pagamento dos servidores cresceu 33% desde 2005, devido a incorporações de gratificação, contratações e pagamento de benefícios como quinquênios.
A resolução da greve está em um impasse. O governo afirma que não negocia com a categoria enquanto houver paralisação. Os sindicatos dizem que não acabam o protesto enquanto não houver reajuste. Amanhã haverá assembleia da categoria na avenida Paulista, juntamente com um protesto contra Serra -que deixa o governo para concorrer à Presidência.


a favor

Bônus melhora aula e reduz falta, diz pesquisador
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma política que prevê salário melhor aos que sejam mais bem avaliados leva a uma melhoria das aulas e a menos faltas de professores, diz Naercio Aquino Menezes Filho, pesquisador da USP e do Insper. (FT)


FOLHA - O sr. prefere reajuste para todos ou aumento com base em desempenho?
NAERCIO AQUINO MENEZES FILHO - Pagar com base no mérito é uma boa ideia. Custaria muito dar aumento para todos. À medida que você implementa a ideia de mérito, o professor procura dar aulas melhores, faltar menos.

FOLHA - Mas não é injusto?
MENEZES FILHO - Não há evidência de que aumento linear de salário aos professores leve à melhoria aos alunos. Os professores estão acomodados. É preciso quebrar isso. Claro que os problemas das escolas não são exclusivamente dos professores. Há, por exemplo, falta de envolvimento das famílias. Mas mudar as coisas fora da escola é mais difícil.

FOLHA - O que o sr. acha da greve?
MENEZES FILHO - Ela [a paralisação] foge um pouco do assunto educação, tem muita política envolvida.

contra

Política aumenta distorção na rede, afirma professor
DA REPORTAGEM LOCAL

A política do bônus aumentará as distorções na rede de ensino, afirma o pesquisador Rubens Barbosa de Camargo, da Faculdade de Educação da USP. (FT)


FOLHA - O sr. prefere reajuste para todos ou por desempenho?
RUBENS BARBOSA DE CAMARGO - Sou contra a política de pagamento com base em mérito. Ela favorece os que já estão mais favorecidos, que trabalham em escolas mais organizadas. Assim, aumenta a distorção na rede, pois os que trabalham em condições piores têm menos chances de bons resultados. E em nenhum lugar do mundo algo parecido foi implementado sem anos de discussões. Aqui saiu da cabeça de um político.

FOLHA - Não é lógico pagar mais a quem tenha mais resultado?
CAMARGO - Pode ser em uma empresa. Como medir a eficiência na educação? A escola não é apenas ensino de português e matemática.

FOLHA - O que acha da greve?
CAMARGO - Chegou a esse nível, de confronto, porque o governo não dialoga. Os salários estão defasados, os professores estão legitimamente reivindicando melhores condições de trabalho.

Nenhum comentário: